O que estava se tornando um sonho para Thiago "
shut" Luis, a oportunidade de representar uma equipe profissional de Counter-Strike ao fazer parte da
Severe Esport, acabou se tornando um martírio para o jogador. Isso porque, desde o ano passado, o jovem está buscando receber o montante que de R$ 20.138,29 referentes a dois meses salários atrasados, multa rescisória pela quebra do contrato antes do término e outras obrigações trabalhistas. Mesmo sabendo das retaliações que pode sofrer do próprio cenário no futuro e das ameaças que recebeu do dono da organização Lucas Abade Mendes Duren, de que se fosse a público iria ser processado, shut procurou a
DRAFT5 para expor o problema. De acordo com o jogador, um processo trabalhista está sendo movido contra o clube. O processo foi aberto em Pouso Alegre, Minas Gerais, pelo advogado Helio Tadeu Brogna Coelho Zwicker, com o jogador buscando pagamentos de fundo de garantia, multa de 40% sobre o fundo, aviso prévio indenizado, férias + 1/3, 13º salário proporcional, recolhimentos previdenciários e mais. shut assinou com a Severe em agosto após o time pelo o qual vinha jogando vencer uma espécie de peneira que a organização realizou em uma plataforma. O contrato oferecido levantou suspeitas em alguns jogadores. Isso porque os documentos apresentados foram formalizados em inglês e não contavam com o CNPJ da organização. Por conta disso, de acordo com o atleta, alguns dos integrantes do time não quiseram assinar. "
O contrato foi firmado em agosto e o primeiro mês recebemos certo. Todo mundo da line recebeu", garantiu shut. Segundo o jogador, o imbróglio começou após o elenco passar pelas primeiras mudanças,
que foram as chegadas de Leonardo "LeoGOD" Silva e Paulo "paulopaulo" Rocha. O rendimento dessa escalação foi aquém do esperado, o que resultou na ida de shut e Matheus "
nitz" Fonseca para o time de base da organização, que foi uma ideia proposta pelo próprio dono do clube. "
Quando eu fui para a Academy, fui como coach porque ele, o Lucas, queria jogadores de 14, 15 anos com o objetivo da organização formar um time de base. Pegamos os jogadores dessa idade, eles assinaram e também não receberam. Nenhum contrato foi pago", afirmou shut. Contudo, o projeto envolvendo a Severe Academy também não durou muito tempo. Os jogadores contratados acabaram sendo dispensados e, com isso, shut e nitz foram colocados na reserva da escalação titular. Nesse período, o atraso no pagamento dos salários já estava acontecendo. "
Quando chegou perto do pagamento, ele não realizou e avisou que ia ter um pouco de atraso. Esse atraso aconteceu e mesmo assim o pagamento não foi feito. A galera começou a cobrar o Lucas, que começou a se esquivar", contou. A situação de shut piorou em setembro, quando foi avisado pelo próprio dono da organização que seria dispensado. Tal aviso foi feito via aplicativo de mensagem, mas a rescisão não foi assinada naquele momento: "
Ele simplesmente disse que tinha uma dívida aberta conosco e que iria pagar assim que desse. Sempre falava em tom ameaçador, dizendo que se a gente falasse algo, iria abrir um processo". A rescisão contratual, de fato, só foi acontecer no final daquele mês, com o dono da Severe prometendo a shut que quitaria o débito no início de outubro, o que não aconteceu. Desde então, quase que diariamente, o jogador busca respostas do executivo, que apenas visualiza as mensagens recebidas. "
Ele simplesmente não responde mais. Ligamos, ele não atende. Mandamos mensagem e ele só visualiza".
O CONTRATO
A
DRAFT5 teve acesso ao modelo do contrato apresentado pela Severe aos jogadores, o qual foi redigido em inglês no nome da empresa
Playmore Esports LLC e com Lucas Abade Mendes Duren. Aos atletas foram oferecidos uma "
compensação" no valor de $ 520 dólares, equivalente a R$ 2.776,80 já que o clube levou em consideração a cotação do dia 13 de julho de 2020. O vínculo ofertado atletas foi de 6 meses. Como a
compensação acertada entre organização e jogador está em dólar, o contrato com uma cláusula que fala que "
se caso o dólar desvalorize ou sofra variação superior a 20% em relação ao real, o jogador concorda com a dissolução dos atuais termos e condições do acordo, visto que o acordo seria renegociado ou rescindido, resultado na ineficácia dos termos e condições atuais, que não estariam mais em vigor". O contrato também estabelece uma multa rescisória no valor de R$ 1 mil, com este valor sendo tanto para caso a ação parta do jogador ou da organização.
O QUE DIZEM AS PARTES
À
DRAFT5, o advogado do atleta deixou claro que, antes da abertura do processo, "
houve tentativa de conciliação antes do início do processo, mas não houve acordo". O defensor de shut afirmou que "
o jogador busca todos os direitos relativos à contratação, desde os salários atrasados, até as multas, passando também pelos direitos trabalhistas (férias, 13º salário, aviso prévio, e outros)". Segundo o advogado, o fato do contrato firmado entre jogador e organização ter sido firmado com o clube não possuindo um CNPJ facilita porque "
a relação negocial inteira foi feita com o sócio do time, de modo que ele é quem responde pessoalmente pelas dívidas do time". Ainda de acordo com o defensor, "
o ontrato é irregular. Para que tivesse validade, era necessário que fosse traduzido para o português para ter efeitos no Brasil, conforme art. 224 do Código Civil". A
Severe também respondeu o contato feito pela
DRAFT5, por meio do advogado que defende o clube: "
A Severe desconhece tal acusação, assim como desconhece o processo alegado aberto contra a organização. Por esse motivo, a Severe vai ser reservar ao direito de ser notificado oficialmente, para tomar ciência do assunto, e ai sim responder em juízo qualquer alegação. De qualquer forma a Severe agradece o contato, e aproveita para deixar claro que e uma empresa que leva a serio os seus compromissos".
SALÁRIO ATRASADO? O QUE UM JOGADOR PODE FAZER
Tendo em vista que este não é o primeiro caso relatado sobre atraso de salário no cenário brasileiro de esportes eletrônicos, a
DRAFT5 conversou com o advogado Guilherme Garcia, do escritório BLS advogados, a fim de esclarecer o que os atletas podem fazer nesse tipo de caso. De acordo Guilherme Garcia, o primeiro caminho a ser tentado pelos jogadores em caso de salário atrasado é o de "
recorrer ao próprio clube e tentar dialogar, independentemente da forma de contratação. Caso haja recusa ou esquiva por parte do clube, recomenda-se notificá-lo a fim de que cumpra suas obrigações e pague os valores devidos". "
Caso haja recusa ou esquiva por parte do clube, recomenda-se notificá-lo a fim de que cumpra suas obrigações e pague os valores devidos. Em seguida, caso ainda assim o clube se esquive ou se recuse a pagar os valores que o jogador entende devidos, este poderá buscar a via judicial com o auxílio de um advogado", completou. Questionado se, no Brasil, um contrato entre duas partes pode ser firmado em inglês ou, obrigatoriamente, em português, o advogado deixou claro que "
não existe proibição de celebração de contratos em língua estrangeira.
No entanto, caso o clube seja estrangeiro e somente celebre contratos em inglês, recomenda-se sempre que o contrato seja redigido em uma versão bicolunada (português e inglês), com uma cláusula prevendo expressamente a prevalência da versão em português sobre a versão em inglês. Isso evitará futuros problemas de interpretação em uma eventual judicialização da relação, uma vez que o judiciário exige tradução juramentada de documentos em língua estrangeira e o tradutor poderá ter diferentes interpretações do conteúdo contratual". Já sobre a falta de CNPJ no contrato, Guilherme Garcia afirmou que, "
excepcionalmente, caso o contratante seja estrangeiro e não possua nenhuma pessoa jurídica ou conta-corrente no Brasil, não há necessidade de um CNPJ, mas é necessário que o contrato detalhe toda a qualificação do contratante no país de origem, assim como do representante legal que assinou o contrato. Porém, na grande maioria dos casos, o contratante deve ter um CNPJ".