Os três subestimados de Nova York

Confira a história de três jogadores que deram a volta por cima em suas carreiras

por Guilherme 'Guiki' Cerdera / 25 de set de 2019 - 19:24 / Capa: HLTV
Dado o longo período de pausa adotado pelos principais times do mundo após o Starladder Berlin Major, a expectativa para o ESL One New York que começa nessa quinta(26) é grande. Alguns times não fizeram nenhuma partida oficial desde Berlim, casos de Astralis FaZe Clan, enquanto outros tiveram apenas compromissos online, como NRG Team Liquid, que jogaram a ECS S8 North America.

Em comum nesse grande torneio, primeiro da ESL nessa temporada, estão três personagens que merecem ser notados. Três jogadores que carregam, de certa forma, o rótulo de "abaixo da média", sendo quase que colocados de lado por onde passam. Vamos falar sobre Peter "stanislaw" Jarguz, Mathias "MSL" Lauridsen e Aleksi "allu" Jalli, os três subestimados em Nova York.

TEMPERAMENTO OBSCURO, RESULTADOS CLAROS

Stanislaw em seus primeiros dias na OpTic | Foto: HLTV


Você investiria em um jogador que deixa o seu time sem avisar aos companheiros? Ou que discute e discorda do coach? Quem sabe um igl que não faz muita questão de criar um clima amistoso? Esse é stanislaw, um dos melhores igls do cenário NA, e, ainda sim, um dos mais problemáticos.

Com uma carreira que ganhou destaque no ano de 2016, quando se juntou à OpTic, o canadense já passou por alguns altos e baixos na carreira, sempre provando seu valor a cada novo desafio apresentado. Os primeiros meses no time acabaram não sendo tão bem sucedidos, e isso fez com que alguns antigos companheiros de stanislaw deixassem o time, caso de Damian "daps" Steele e Shahzeeb "ShahZaM" Khan.

A primeira vitória viria com a chegada de Oscar "mixwell" Cañellas e Tarik "tarik" Celik no Northern Arena 2016 Montreal. O melhor, entretanto, ainda estava por vir. Com um fim de 2016 incrível, a OpTic impressionou o mundo ao ser campeã da ELEAGUE Season 2 e segundo colocada na ECS Season 2, ambas enfrentando a poderosa Astralis na final.

OpTic vence Eleague Season 2 | Foto: HLTV


Marcando um rating de 1.01 no ano de 2016, talvez a capacidade de resolver "na bala" não seja lá a mais forte de Peter. Ainda sim, a forma com que criou uma equipe tão poderosa à partir de jogadores tidos como simples "fraggers" chamou atenção. O "muro verde", apelido da OpTic, tinha tudo para crescer ainda mais, e a oportunidade perfeita era ELEAGUE Major de Atlanta.

Infelizmente para os fãs, o desempenho no Major foi uma decepção. O time acabou eliminado com 1-3 e não prosseguiu para a fase de legends. O resultado pode ter sido ruim, mas a equipe provavelmente teria novas chances de fazer sua line se tornar vencedora novamente. A decisão de stanislaw, entretanto, foi outra. Sem avisar a ninguém do time o jogador se desligou da organização e rumou para a rival Team Liquid.

Em 2017 stanislaw estava no momento mais alto de sua carreira. Líder da maior organização norte-americana de CS:GO, valorizado por seu trabalho na OpTic, considerado um fragger razoável e upgrade em relação a Spencer "Hiko" Martin, até então um grande jogador do cenário.

Stanislaw e o fracasso inesperado na Liquid | Foto: HLTV


Contrariando todas as estatísticas, o canadense teve o momento menos vitorioso desde que entrou no cenário. A Liquid não vencia torneios, nem os menores como DreamHack Open e afins, foi eliminada duas vezes pela ex-equipe de stanislaw, e não conseguiu voltar a participar de Majors. Um ano para se esquecer completamente na história azul e branca.

Somado ao desempenho pífio dentro do servidor, fora dele as coisas não iam melhores. Stanislaw tinha problemas de relacionamento com a equipe, principalmente com o coach brasileiro Wilton "zews" Prado. As principais divergências eram sobre a forma de abordar problemas, com zews lhe dizendo que ele era "uma pessoa que não aceitava críticas", e o jogador afirmando que o maior problema do time "era ter trazido ele para ser líder da equipe, mas já terem essa pessoa em zews", e que "os dois tinham formas muito diferentes de liderar". De forma melancólica o canadense deixou a equipe após um ano com um rating de 1.04 e nenhum título.

Após a despedida, stanislaw aceitou uma proposta para voltar à OpTic e tentar trazer de volta o prestígio tanto da organização quanto dele mesmo. O experimento com três dinamarqueses no time acabou se tornando um desastre, com a dissolução da equipe em apenas 2 meses, e com Kristian "k0nfig" Wienecke e ele trocando ofensas pelo Twitter. O próximo ponto de parada foi a compLexity, onde o canadense teria que reconstruir sua carreira com um time considerado tier 2.

compLexity de volta aos holofotes | Foto: HLTV


A chegada ao time da col representou uma imediata mudança de atitude. Acompanhado de seu companheiro de longa data, Shazam, a organização americana passou de uma equipe passiva e previsível, para um time cheio de teamplay e jogadas inusitadas. Era a tal "química" que o stanislaw não encontrava desde o sucesso em 2016 com a OpTic.

Com o auxílio do capitão a compLexity passou a vencer praticamente todos os classificatórios de 2018, participando cada vez mais de competições de alto calibre em lan. O time não passava tão perto de ser campeão, mas era nítida a evolução. Chegando como campeão do Minor para disputa do FACEIT Major: London 2018 a compLexity surpreendeu a todos quando alcançou até a fase de legends.

O time seguiu conseguindo atuações interessantes 2019, mas seria difícil de passar do nível que haviam chegado sem mudanças na line. Stanislaw se tornou um líder com mais poder de fogo, chegando ao rating de 1.06 no ano de 2018, e sentiu a oportunidade de crescer. A escolhida dessa vez, entretanto, seria uma equipe com sua cara, que também cresceu aos poucos no cenário, a NRG Esports.

NRG é campeã do Minor NA | Foto: HLTV


Na NRG, Peter encontrou velhos conhecidos como Tarik e Chet "ImAPet" Singh, e rapidamente se encaixou no estilo que havia sido criado pelo ex-capitão daps. Com pouco tempo de treino a equipe alcançou a terceira posição na BLAST Pro Series: Los Angeles, além de ter conseguido vaga no Minor das Américas.

O time seguiu o bom momento e conquistou o título no Minor, seguindo como uma forte equipe para finalmente se firmar dentro de um Major. E desse vez, sem surpresas negativas, a NRG passou voando por todas as etapas do Major de Berlim, chegando até o status de legends, e crescendo a expectativa do time pelo futuro.

Com um rating de 1.06 em 2019, mas liderando algumas das melhores miras do mundo, stanislaw provou seguidamente, que pode voltar ao topo e surpreender qualquer time que o leve a sério.

O DISTANTE SONHO DINAMARQUÊS

North e o sonho de ser nova Astralis | Foto: HLTV


Em 2016 MSL liderava a dignitas, e se não era chamada de uma das melhores do mundo, a equipe conseguia grandes resultados, como quando derrotou a Virtus.pro em terras russas e garantiu o título da Epicenter Moscou daquele ano. A equipe chamou a atenção de um projeto puramente dinamarquês, e foi adquirida como parte do clube de futebol  FC Copenhagen, sobre uma organização chamada North.

Desde então as expectativas colocadas sobre o igl MSL se tornaram as maiores possíveis. Na época, a vitória da Astralis no Atlanta Major de 2017 criou uma rivalidade natural entre as equipes da mesma região. Seria tarefa para um jogador de baixo desempenho individual liderar uma equipe de estrelas para desbancar os concorrentes dinamarqueses.

Ao longo de 2017, a North conseguiu alcançar o status de legends nos dois Majors daquele ano, caindo nas quartas de finais contra os poloneses da Virtus.pro por duas vezes. A equipe foi vencedora ainda do polêmico Dreamhack Open Montreal 2017, em que derrotaram a Immortals com um wo no primeiro mapa, com MSL fazendo um bom rating de 1.17 durante o torneio, realidade distante dos 0.98 que havia feito no ano, e só um pouco abaixo do MVP Kristian "k0nfig" Wienecke com 1.20.

North sendo liderada por MSL no Major da Cracóvia | Foto: PGL


O ano de 2018 foi mais um de sentimentos misturados para MSL. Seus liderados dinamarqueses mudaram muito, com entradas e saídas de caras como Emil "Magisk" Reif, kickado ainda em 2017, Daniel "mertz" Mertz, Nikolaj "niko" Kristensen, René "cajunb" Borg e o próprio k0nfig, antes tido como a grande estrela do time.

A equipe teve atuação pífia no Major de Boston, caindo 0-3 na fase de challengers, mas se recuperou com títulos no DreamHack Open Tours e DreamHack Open Valencia. MSL foi ainda o MVP de um torneio de grande relevância, o DreamHack Masters Stockholm 2018com um incrível rating de 1.24, derrotando a Astralis na final.

Com rating em 2018 de apenas 0.99, o capitão dinamarquês era alvo da frustração de torcedores que atribuíam a ele o fracasso de sua equipe. Por esse motivo, após a vitória em Stockholm, MSL revelou em entrevista à hltv.org :"Eu fui tão criticado, tantas vezes me senti péssimo com meu desempenho, e agora estou aqui segurando essa medalha".

MSL leva o MVP do DreamHack Masters Stockholm | Foto: HLTV


A expectativa sobre a North no FACEIT Major: London 2018 era a mais alta possível, já que eles haviam derrotado a então melhor equipe do mundo menos de um mês atrás. O problema parecia ter sido exatamente este. Com ego inflado, e estratégias facilmente lidas, MSL e seus companheiros deixaram o campeonato em um melancólico 2-3, em que quase foram eliminados para a Rogue, e acabaram caindo diante da Vega Squadron.

Com mais uma decepção MSL entrou na mira das críticas novamente. Diferente de outros momentos, a North entendeu que não deveria trocar outros jogadores, e que seria a vez de Mathias dar lugar a outro igl awper que tinha feito sucesso, Casper "cadiaN" Møller. Em troca de um para um, MSL foi para a Rogue após quase 2 anos de serviço, enquanto cadiaN ocupou seu lugar na North.

MSL deixou a North após não alcançar regularidade | Foto: HLTV


Com curta passagem na Rogue, MSL não conseguiu alcançar nenhum resultado relevante e deixou a equipe em menos de seis meses. O jogador seguiu seu caminho de volta para a Europa, voltando a jogar com velhos conhecidos de North na OpTic Gaming. O time conseguiu seu primeiro título este ano, com MSL vencendo mais um torneio DreamHack, dessa vez DreamHack Open Summer. Com a mudança, o rating do jogador também cresceu no ano, chegando a 1.08.

O time vive hoje uma espécie de limbo, já que não pode mais atuar sobre a bandeira da OpTic, uma vez que a organização foi comprada pela Immortals Gaming Club, mesma dona de MIBR. O time ainda passou por mudanças recentes com a volta de cajunb e a entrada do jovem talento René "TeSeS" Madsen.

Apesar de toda instabilidade, os dinamarqueses venceram o GG.Bet New York Invitational e garantiram vaga no ESL One New York. Com fama de voltar à cena quando menos se espera, as equipes precisam tomar cuidado com MSL e seus companheiros, pois ele já mostrou que ser subestimado é caminho para título.

UM DEUS E UM CONE

Allu atuando pela mousesports | Foto: HLTV


É difícil precisar o momento exato da entrada de allu no cenário competitivo de Counter-Strike. O jogador tem rodado a Europa em função do jogo desde meados de 2009, mas já participava de pequenos torneios locais em seu país de nascimento, a Finlândia. O que deve ser focado em sua trajetória são as vezes em que ela se confundiu a da ENCE.

Voltamos a 2013 quando o jogador fazia parte de uma primeira formação da organização finlandesa. Allu era um dos melhores do time, com rating que beirava 1.18 no ano, mas poucas chances de jogar nos principais palcos do mundo. Foi contratado para defender as cores da mousesports em 2014, e se destacou com um rating de 1.22, a ponto de ser contratado pela 3Dmax que estava montando um time todo da Finlândia. Em poucos meses se destacou novamente e foi chamado para defender as cores da poderosa Ninjas in Pyjamas, que procurava se restabelecer como potência européia.

Allu e a saga insuficiente na NIP | Foto: HLTV


Durante sua primeira passagem pelos ninjas, allu poderia dizer que fez seu trabalho muito bem. O time chegou a ganhar títulos online de menor expressão, e chegar longe em grandes campeonatos, mas isso era insuficiente para um time que brigava à época pela posição de melhor do mundo.

Sendo o único vindo de fora de uma composição lendária e sueca, o finlandês era constantemente alvo de críticas pela falta de consistência, que mais tarde se transformaria nos memes "god allu, bot allu". Ao final de 2015 o awper havia caído em suas estatísticas pessoais e terminado o ano com um rating de 1.05.

O caminho não poderia ser outro, mais uma vez allu retornou ao lugar que pode chamar até hoje de casa, a ENCE. Com um início de 2016 mais uma vez ótimo, o finlandês recebeu uma nova proposta, e dessa vez de nível tão alto quanto a feita pela NIP. Allu seria o main awper de uma organização que vinha para ser uma potência internacional, a FaZe Clan.

Kioshima e Allu na FaZe em um momento de vitória | Foto: HLTV


Atuando com a camisa da FaZe, o finlandês teve um final de 2016 regular, mas despontou em 2017. A equipe conseguiu alcançar o status de legends e iniciou uma série disputada de torneios contra os brasileiros da SK Gaming e os dinamarqueses da Astralis. O jogador e seus companheiros conquistaram o título do StarSeries Season 3, e ficaram com o vice no IEM KatowiceIEM Sydney ECS Season 3 daquele ano.

Finalmente allu estava jogando por um time com chances de vitórias em todos os torneios em que participava. Só que a eliminação precoce do Major da Cracóvia, somada à oportunidades da FaZe em adquirir outros jogadores como Ladislav "GuardiaN" Kovács e Olof "olofmeister" Kajbjer fazem com que allu e Fabien "kioShiMa" Fiey sejam dispensados. O finlandês é contratado então pela OpTic, time pelo qual os três personagens de nossa história passaram, e tenta recriar o sucesso de um super time internacional.

Allu em atuação pela OpTic | Foto: HLTV


Ao lado de grandes nomes como Adam "friberg" Friberg e Emil "Magisk" Reif, allu tenta repetir a boa forma de anos passados, mas esbarra na falta de sinergia entre os companheiros. A presença do jovem Kevin "HS" Tarn não é correspondida em poder de fogo, e a ausência de função num híbrido Oscar "mixwell" Cañellas também deixa a desejar.

O time segue chegando aos principais torneios, mas não consegue cravar nenhuma boa colocação. A ausência em Majors também coloca a equipe na parede, e aponta para o óbvio: seria preciso mais tempo para que um time como esses desse certo. O jogador ainda permanece até 2018 na equipe, até que anuncia a sua volta, pela terceira vez, ao time que o levou aos holofotes, novamente a ENCE.

Com um contrato assinado de dois anos, e sendo o único jogador na line, allu teve o trabalho de construir a ENCE vitoriosa que vemos hoje, pedaço a pedaço. Era um projeto a longo prazo, com um time de novos jogadores, pouco conhecidos do público e sem badalação.

O time inicia sua caminhada com bons resultados, chamando a atenção pelo estilo agressivo e solto pelos mapas. A equipe disputa competições menores e acumula títulos como GGBET Majestic, torneio que dava vaga direta ao ESL Cologne, VectoramaASUS ROG Finnish ChampionshipEPICENTER 2018 - Wild CardESEA Season 28: Premier Relegation. O primeiro grande título do tradicional estandarte finlandês veio no StarSeries Season 6.

ENCE é campeã do StarSeries S6 | Foto: HLTV


A equipe seguiu empilhando títulos menores, como Assembly WinterDreamHack Open Winter e o Minor Europeu, resultando no maior feito da line até hoje, um segundo lugar durante o IEM Katowice Major 2019. A fantástica campanha teve direito a eliminação das poderosas Liquid e Natus Vincere, além de uma final contra a imbatível Astralis.

É bem verdade que a ENCE por si só é uma equipe repleta de grandes talentos, mas allu conseguiu encontrar seu espaço e ser um dos jogadores mais importantes do time. Com um rating de 1.15 em 2018, e 1.16 em 2019, o jogador finlandês ainda dá sinais de irregularidade, mas mostra que nunca é possível saber se o God allu aparecerá no servidor.

Os três tentarão levar suas equipes ao título em Nova York, basta ficarmos de olho se mais um sucesso chegará na carreira destes veteranos tão subestimados no cenário de Counter Strike.

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