Natural de Nova Friburgo, no Rio de Janeiro, Gabriel "ponter" Amaral trocou a tranquilidade da Região Serrana do RJ para ir em busca da realização de um sonho. Assim como grande parte dos jogadores profissionais, iniciou a trajetória no mundo dos jogos apenas para se divertir enquanto tentava encontrar uma forma de se divertir além da escola.
Quase quatro anos após optar por seguir a vida profissional de um jogador de Counter-Strike: Global Offensive, ponter se vê na lista dos melhores jogadores do Brasil depois de fazer uma temporada recheada de conquistas em 2022, principalmente após a chegada na ARCTIC, equipe que foi uma das melhores do país no último ano competitivo.
Antes de mostrar todo o talento em Counter-Strike para o mundo, Gabriel Amaral, como ainda era conhecido na época, revelou para a DRAFT5 uma infância comum de muitos brasileiros. Baseada em estudos, futebol e videogame — não obrigatoriamente nessa devida ordem —, viu o primeiro contato com os jogos ainda nos consoles.
Nascido em 2001, ponter teve a oportunidade de jogar PlayStation 1. Isso, sim, é um tanto quanto raro, tendo em vista que o PlayStation 2 foi lançado em 2000, um ano depois do nascimento do atual jogador da ARCTIC. De qualquer maneira, fez com que ele vivesse a raiz dos jogos antes de ser apresentado para o computador.
"Eu fazia basicamente o que todo moleque fazia: jogava bola em qualquer lugar, estudava e jogava videogame. Meu primeiro contato com jogos foi no PlayStation 1, mas não me recordo o nome dos joguinhos. Depois fui para o PlayStation 2 e fiquei muito tempo nele. Logo após fui para o computador, inicialmente em jogos browser e, posteriormente, em jogos "mais robustos", disse ponter.
Entretanto, o jovem da Região Serrana do Rio de Janeiro — local relativamente próximo de onde este que vos escreve mora — tinha na limitação de um equipamento de qualidade a principal barreira para que ele conseguisse desenvolver melhor nos jogos que seria apresentado no decorrer da vida, incluindo Counter-Strike.
Ao invés de sentar e reclamar da falta de oportunidade que tinha de jogar com um computador que fizesse o Counter-Strike rodar a mais de 50 FPSs, ponter optou por levantar a cabeça e ir atrás daquilo que poderia fazer com que ele realizasse o sonho de ir mais longe no jogo da Valve. Por isso, foi atrás de um trabalho que desse oportunidade para ele comprar um PC melhor.
"Quando eu completei 18 anos e terminei a escola, estava determinado a dar uma chance para mim e tentar virar profissional. Porém, eu tinha um computador ruim e quase não rodava Counter-Strike direito. Foi aí que eu decidi postergar esse sonho por 10 meses, tempo que arrumei um trampo e juntei dinheiro para comprar um PC bom".
Por trás de quase todos os jogadores brasileiros há uma história de superação que faz com que cada conquista se torne mais especial para cada um deles. Se o principal problema na época era a ausência de um computador de qualidade, ponter conseguiu resolvê-lo antes de precisar lidar com um novo que apareceria dentro de casa: os pais.
Para as gerações mais novas é um tanto quanto complicado explicar para os pais que é possível viver de um "joguinho". Seja jogar de Counter-Strike, League of Legends ou outras modalidades, há sempre a necessidade de convencê-los de que existe uma carreira por trás de cada um destes jogos e que é possível viver disso.
Mesmo com um equipamento limitado, ponter sempre ouviu dos colegas que jogava casualmente de que ele era "diferente dos players casuais" e que precisava se dedicar profissionalmente a isso. Com um computador melhor em mãos, chegou a recusar uma oferta feita pela Reapers para disputar o CBCS em São Paulo em função da desconfiança dos pais.
"Eu joguei casual a minha vida toda e a galera sempre dizia que eu era bom, que eu era diferente dos players casuais (...) No início foi um pouco complicado. No segundo semestre de 2019, enquanto eu estava trabalhando, recebi o convite da Reapers na época da reformulação deles para o CBCS. Meus pais não entendiam muito e não deixaram eu ir", disse o jogador.
Mesmo jovem, ponter já se mostrava um jogador paciente e que não se importava em esperar as oportunidades que a vida lhe daria para o futuro. Desta forma, viu nessa oportunidade a chance de começar a apresentar o esporte eletrônico para aqueles que carimbariam o passaporte para ele viver profissionalmente.
"A partir daí eu fui meio que introduzindo eles ao mundo gamer, do que se tratava, etc. E eles foram ficando por dentro e deixaram numa boa. Devo muito ao Yuji e à mãe dele, essenciais para convencer meus pais a me deixarem ir morar em São Paulo na época da Prodigy. Hoje, me apoiam 100%, acompanham os jogos, torcem, mandam mensagem", celebra o jogador da ARCTIC.
Com apenas 21 anos, ponter viu a vida profissional acontecer de verdade a partir do fim de 2019. Na época, o convite veio do próprio Lucas "YJ" Yuji. Depois de ter que passar por todo o processo de convencimento com a família do jogador carioca, conseguiu fazer com que o atleta finalmente desse o primeiro passo na vida de pro player.
A oportunidade veio na Prodigy durante quase uma temporada inteira. O jogador chegou à equipe np início de 2020 e permaneceu por lá durante quase todo o ano. Sem títulos, foi criando casca ao disputar alguns dos principais torneios que disputou naquele ano, como Aorus, CBCS: The Conquest, Esportsmaker Invitational e Tribo to Major.
Mesmo longe de todos os holofotes como está atualmente, o jogador e a equipe conseguiram ir bem em diversos deles, chegando a três semifinais de torneios importantes para o cenário competitivo. Em duas oportunidades avançaram até a final, mas acabaram com a segunda colocação no ESEA Season 34 do Brasil e no Esportsmaker Invitational.
Um dos melhores riflers do Brasil atualmente, ponter precisou atuar em outras funções para conseguir se firmar no cenário competitivo. Na própria Prodigy, por exemplo, jogou como AWPer mesmo sem ser muito fã da posição. Entretanto, foi peça importante para tapar o buraco que a equipe possui naquela altura.
"Na Prodigy eu exercia a função de AWPer por conta de não ter um no time. Eu meio que tapei esse buraco mesmo não gostando muito de ser o sniper primário", disse o jogador consciente de que isso tudo serviu para que ele tivesse "uma evolução e tanto".
Gostasse ou não de assumir o papel de AWPer no time, ponter viu na Prodigy a oportunidade perfeita para ser lançado no mercado brasileiro. Prova disso é que depois que deixou a equipe recebeu a oportunidade de passar por organizações consagradas no Counter-Strike do Brasil, como Vivo Keyd, Black Dragons, Daotsu e, por último, ARCTIC.
À DRAFT5, ponter confessou que foi evoluindo frequentemente até chegar ao padrão de jogo que possui hoje. Na época da Vivo Keyd, por exemplo, o jogador atuava com rifler e era o coringa do elenco, algo que o fazia bastante feliz no servidor. Na Black Dragons, no entanto, acabava vendo essa função não ser algo fixo. Na ARCTIC está jogando em casa e se sente bem no servidor.
"Na Vivo Keyd eu pude fazer a função que gostava de rifler. Era também o playermaker e coringa, e gostava bastante dessa função. Na Black Dragons eu era um dos integrantes do bloco, porém sem uma função fixa do meu lado CT. Na ARCTIC, que é o momento em que eu me sinto mais completo, pude mostrar um jogo bem sólido com a ajuda dos meus companheiros de time".
Independentemente de tudo que havia aprendido como jogador profissional nas diversas oportunidades que teve, ponter ainda não havia conquistado uma grande competição na carreira. Mesmo tendo passado por Vivo Keyd e Black Dragons, organizações consagradas do Brasil, o primeiro triunfo do jogador tardou para acontecer.
Quem vê ponter como o 19º melhor jogador do Brasil na temporada pode até imaginar que o jogador teve vida fácil para chegar tão alto na carreira. No entanto, o primeiro semestre do carioca não foi nem sombra de tudo aquilo que ele conquistaria nos meses seguintes. Sem conseguir grandes conquistas pela BD, se juntou à Daotsu onde também não conseguiu bons resultados.
A chegada à ARCTIC foi a virada de chave que ponter precisava na carreira, onde conseguiu se unir a um elenco que vinha começando a ensaiar algumas conquistas desde o início do ano. Entretanto, a entrada de ponter e de Allan "history" Lawrenz foi tudo que eles precisavam para conseguir fechar a temporada vencendo praticamente todas as grandes competições.
Entre as principais conquistas do ano está a ida para o Regional Major Ranking das Américas depois de brilharem na seletiva da América do Sul. Ponter e o elenco viajaram para Estocolmo, na Suécia, onde tiveram a oportunidade de ir em busca de uma classificação épica para o IEM Rio Major 2022. Entretanto, o time caiu para a paiN Gaming, ATK e Isurus e se despediu precocemente.
Depois disso, a ARCTIC mostrou que só conseguiu ficar ainda mais forte e pronta para o calendário competitivo do Brasil nos meses seguintes. Alguns dias depois de voltar de Estocolmo, ponter e os companheiros enfrentaram a Daotsu pelo CBCS Masters 2022 e garantiram o título do torneio disputado durante o Rock in Rio.
Esta foi apenas a primeira conquista de ponter junto à ARCTIC. Nos quatro meses seguintes que faltavam para terminar o ano, ainda conseguiram conquistar o CBCS Elite League Season 2, Logitech G Challenge 2022: Brazil e o CBCS Finals 2022. Além disso, bateu na trave no CBCS Invitational e ESL Brasil Premier League Season 13.
"Foram diversos fatores que me impulsionaram e ajudaram na minha evolução. Morar em GH foi um deles. Ter suporte psicológico foi sem dúvidas, para mim, o mais importante para todos. Muito obrigado, Matheus, nosso psicólogo. Mais um fator crucial foi o trabalho do short e do exp. O nosso sucesso é graças aos dois, pois me designaram novas funções e eu me encaixei muito bem nelas".
As conquistas pessoais são consequência de um trabalho coletivo bem feito na ARCTIC. Consciente disso, ponter destaca justamente todo o trabalho realizado pela organização e pelos companheiros de time no decorrer do último ano para que ele conseguisse viver aquilo que define como o melhor ano competitivo qeu já teve.
"(O ano de 2022) Foi de longe o melhor da minha carreira. Vencemos vários títulos em LAN, o que é muito mais legal. Tivemos a nossa primeira experiência internacional juntos. Evoluímos bastante desde a minha entrada até o fim do ano. Conheci e convivi com pessoas ímpares que influenciaram bastante na minha evolução como jogador e como pessoa. Sou muito grato a todos", disse ponter sobre 2022.
Durante toda esta temporada, ponter conseguiu somar somente um título pessoal de Most Valuable Player (MVP). Entretanto, ele veio na competição mais importante da temporada para a ARCTIC: o CBCS Finals 2022. O jogador conseguiu ser o melhor no servidor na reta final da competição que deu o título para o time que havia vencido praticamente toda a segunda leva do CBCS em 2022.
Entretanto, o jogador também se mostrou importante em diversas outras atuações e títulos da ARCTIC neste ano. Em competições como CBCS Masters 2022, CBCS Elite League Season 2 e Logitech G Challenge, torneios onde conquistou o troféu de campeão, ponter conseguiu ser o EVP. O termo é designado para os principais nomes de um torneio.
Além disso, ele também conseguiu se destacar em competições que a ARCTIC sequer levantou o troféu de campeão. Mesmo fora do lugar mais alto do pódio, ponter conseguiu ser o EVP da Copa dos Campeões, GC Série A de junho e BGS 2022. Além disso, também foi um dos principais jogadores do RMR Road to Rio 3.
"Sem dúvidas nenhuma estou na melhor fase da minha carreira. Não pelos números, mas sim pelos títulos, pelas conquistas. Desde que cheguei, fui muito bem acolhido e recebido por todos do time e da staff. E isso facilita muito o processo, se sentir em casa, sabe? Com todo o trabalho que a gente faz tanto dentro quanto fora do servidor, não tinha como ter resultado diferente a não ser títulos e boas partidas".
Somando todas as conquistas, ponter teve 5 C Points, que são os destaques do jogador em conquistas coletivas. Já os D5 Points, pontuação baseada em MVP/EVPs e que cada um tem um determinado peso, o atleta somou 83,6.
Títulos nacionais de grande calibre, classificação seletiva internacional e conquistas pessoais. Com um 2022 tão próspero, fica difícil ponter traçar metas para a próxima temporada que não sejam um tanto quanto ambiciosas. Entretanto, toda a paciência que o jogador de Nova Friburgo mostrou ter durante toda a vida profissional criou nele a virtude de esperar o momento correto para receber as recompensas.
Justamente por isso, antes de começar a pensar em títulos e torneios de calibre internacional, ponter destaca que é preciso manter o empenho e dedicação para conseguir alcançar o que deseja. À DRAFT5, o jogador disse que quer dar continuidade no trabalho psicológico que o ajudou no decorrer do último ano para que, quem sabe, novos títulos apareçam em 2023.
"Um cara mais maduro, com a mesma vontade e empenho de sempre, focando sempre na evolução individual e coletiva do time, dar continuidade ao trabalho psicológico que tem me ajudado muito a manter a calma durante os jogos, nos momentos de pressão, e manter a minha constância visando conquistar mais títulos do que em 2022".